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STF: Cônjuges ou companheiros não se diferenciam em termos de herança

No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a diferenciação de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no artigo 1.829 do Código Civil.


Com base nesse entendimento, o Plenário, ao apreciar o Tema 809 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário para reconhecer, de forma incidental, a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil de 2002 (1) e declarar o direito da recorrente a participar da herança de seu companheiro, em conformidade com o regime jurídico estabelecido no art. 1.829 do referido código (2) (vide Informativos 837 e 859).

No caso, a recorrente vivia em união estável, em regime de comunhão parcial de bens, há cerca de nove anos, até seu companheiro falecer, sem deixar testamento. O falecido não tinha descendentes nem ascendentes, apenas três irmãos.

O tribunal de origem, com fundamento no art. 1.790, III, do Código Civil de 2002, limitou o direito sucessório da recorrente a 1/3 dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável, excluídos os bens particulares do falecido, os quais seriam recebidos integralmente pelos irmãos. Porém, se fosse casada com o falecido, a recorrente teria direito à totalidade da herança.

O Supremo Tribunal Federal afirmou que a Constituição contempla diferentes formas de família, além da que resulta do casamento. Nesse rol incluem-se as famílias formadas mediante união estável. Portanto, não é legítimo desequiparar, para fins sucessórios, os cônjuges e os companheiros, isto é, a família formada por casamento e a constituída por união estável. Tal hierarquização entre entidades familiares mostra-se incompatível com a Constituição.

O art. 1.790 do Código Civil de 2002, ao revogar as Leis 8.971/1994 e 9.278/1996 e discriminar a companheira (ou companheiro), dando-lhe direitos sucessórios inferiores aos conferidos à esposa (ou ao marido), entra em contraste com os princípios da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade na modalidade de proibição à proteção deficiente e da vedação ao retrocesso.

A Corte ainda ressaltou que, com a finalidade de preservar a segurança jurídica, o entendimento ora firmado aplica-se apenas aos inventários judiciais em que a sentença de partilha não tenha transitado em julgado e às partilhas extrajudiciais em que ainda não haja escritura pública.

Vencidos os ministros Dias Toffoli, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, que negaram provimento ao recurso. Para eles, a norma civil apontada como inconstitucional não hierarquiza o casamento em relação à união estável, mas acentua serem formas diversas de entidades familiares. Nesse sentido, ponderaram que há de ser respeitada a opção dos indivíduos que decidem submeter-se a um ou a outro regime.



Com base nesse entendimento, o Plenário, ao apreciar o Tema 498 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário para reconhecer, de forma incidental, a inconstitucionalidade do art. 1.790 (1) do Código Civil de 2002 e declarar o direito do recorrente de participar da herança de seu companheiro, em conformidade com o regime jurídico estabelecido no art. 1.829 do referido código.

No caso, o tribunal de origem assentou que os companheiros herdam apenas os bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, quando presentes os requisitos do art. 1.790 do Código Civil de 2002. Consignou ser imprópria a equiparação da figura do companheiro à do cônjuge e afastou a aplicação do art. 1.829, I e II (2), do citado diploma legal. Ao interpretar o art. 226, § 3º (3), da Constituição Federal (CF), concluiu que não estariam igualados, para todos os fins, os institutos do casamento e da união estável.

O Supremo Tribunal Federal (STF) afirmou que a Constituição prevê diferentes modalidades de família, além da que resulta do casamento. Entre essas modalidades, está a que deriva das uniões estáveis, seja a convencional, seja a homoafetiva.

Frisou que, após a vigência da Constituição de 1988, duas leis ordinárias equipararam os regimes jurídicos sucessórios do casamento e da união estável (Lei 8.971/1994 e Lei 9.278/1996).

O Código Civil, no entanto, desequiparou, para fins de sucessão, o casamento e as uniões estáveis. Dessa forma, promoveu retrocesso e hierarquização entre as famílias, o que não é admitido pela Constituição, que trata todas as famílias com o mesmo grau de valia, respeito e consideração.

O art. 1.790 do mencionado código é inconstitucional, porque viola os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade na modalidade de proibição à proteção deficiente e da vedação ao retrocesso.

Na espécie, a sucessão foi aberta antes de ser reconhecida, pelo STF, a equiparação da união homoafetiva à união estável e antes de o Conselho Nacional de Justiça ter regulamentado o casamento de pessoas do mesmo sexo. Tal situação impede a conversão da união estável em casamento, nos termos do art. 226, § 3º, da CF. Diante disso, a desequiparação é ainda mais injusta.

Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator) e Ricardo Lewandowski, que negaram provimento ao recurso.

O ministro Marco Aurélio pontuou ser constitucional o regime sucessório previsto no art. 1.790 do Código Civil de 2002, que rege a união estável, independentemente da orientação sexual dos companheiros.

O ministro Ricardo Lewandowski entendeu que a distinção entre casamento e união estável feita pelo constituinte (CF/1988, art. 226, § 3º) justifica o tratamento diferenciado no que diz respeito ao regime sucessório das pessoas que optam por uma dessas duas situações ou por um desses dois regimes.

RE 646721/RS, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 10.5.2017. (RE-646721)

(1) Código Civil/2002: “Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles; III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança; IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.”
(2) Código Civil/2002: “Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III – ao cônjuge sobrevivente; IV – aos colaterais.”
(3) CF/1988: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”

Fonte: Informativo n° 864 de Jurisprudência do STF
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Direito de Família: Divórcio em Cartório


A partir de 2007, com o advento da Lei 11.441 que acrescentou o art. 1.124-A ao Código de Processo Civil tornou-se possível a realização de divórcio e separação consensual em cartório, mediante escritura pública, resolvendo-se as questões relativas à partilha dos bens, à pensão alimentícia e ao uso do nome, desde que não haja filhos menores ou incapazes do casal e desde que haja assistência de advogado comum ou separado, veja:

Lei 5.869/1973 - Art. 1.124-A.  A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.  (Incluído pela Lei nº 11.441, de 2007).

§ 1º  A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis.         (Incluído pela Lei nº 11.441, de 2007).

§ 2º  O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. (Redação dada pela Lei nº 11.965, de 2009)

§ 3º  A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei.        (Incluído pela Lei nº 11.441, de 2007).

Com o novo Código de Processo Civil que entra em vigor neste mês, acrescentou ainda a possibilidade de extinção consensual de união estável  por escritura pública, veja:

Lei 13.105/2015 Art. 733. O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual de união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731.

§ 1º A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.

§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os interessados estiverem assistidos por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. 


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Direito de Família: Bens na União Estável

Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito.
Cessa tal presunção se a aquisição patrimonial ocorrer com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união.
(Artigo 5 da Lei nº 9.278)



Nesse sentido, as seguintes decisões:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE INVENTÁRIO - COMPANHEIRA SOBREVIVENTE - CONCORRÊNCIA COM ASCENDENTE - ARTIGOS 1.685, 1.829, II, E 1.837 DO CC/02 - REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS - DIREITO À MEAÇÃO E À HERANÇA - RECURSO PROVIDO. 
1. No caso concreto, os efeitos do casamento pelo regime obrigatório de separação de bens passaram a vigorar, somente, a partir da prolação da sentença de conversão, valendo antes disso o regime de comunhão parcial de bens, sabendo-se que se comunicam os bens que sobrevierem aos companheiros na constância da união estável, presumindo-se a aquisição pelo esforço comum das partes, na esteira dos artigos 1.658, 1.659 e 1.725 do CC/02, bem como do artigo 5º da Lei nº 9.278/96.
2. A meação é a parte que cabe ao cônjuge/companheiro supérstite (artigo 1.685 do CC/02), compreendendo a metade dos bens do acervo hereditário, não se confundindo com a herança (artigos 1.829, II e 1.837 do CC/02).
3. A agravante, na qualidade de companheira sobrevivente, além de fazer jus a 50% (cinqüenta por cento) do patrimônio comum do casal, correspondente à sua meação, tem o direito de herdar 25% (vinte e cinco por cento) do quinhão restante, ficando os outros 25% (vinte e cinco por cento) para a agravada, genitora do finado, o que impõe a reforma do julgado que determinou a partilha meio a meio.
4. Recurso provido.
(TJMG -  Agravo de Instrumento-Cv  1.0024.09.541518-8/005, Relator(a): Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto , 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 08/10/0015, publicação da súmula em 14/10/2015)


EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA - BENS ADQUIRIDOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - COMUNICAÇÃO - AUSÊNCIA DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA A FORMAÇÃO DA CONVICÇÃO SOBRE A EXISTÊNCIA DE SUB-ROGAÇÃO.
- No regime da comunhão parcial de bens, aplicável, no que couber, às relações patrimoniais na união estável (art. 1.725CC), comunicam-se os bens imóveis que sobrevierem ao casal na constância da união (art. 1.658CC), ainda que adquiridos em nome de um só dos companheiros (art. 1.660ICC), ressalvadas as hipóteses excludentes do art. 1.659 do Código Civil.
- Incumbe à parte autora a prova dos fatos constitutivos de seu direito e à parte ré a prova da existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora, nos termos do artigo 333 do CPC. Logo, cada parte envolvida na demanda deve trazer aos autos os elementos fáticos do direito que pretende seja reconhecido.
- Ante a ausência de prova acerca da sub-rogação de bens que se pretende excluir da partilha, prejudicada fica a formação do convencimento do Julgador sobre a questão, prevalecendo a presunção de que o bem é comunicável por ter sido adquirido na constância da união.
- Primeiro recurso não provido e segundo provido, em parte.
(TJMG - AC 10261120029291001 MG, Relator(a): Ana Paula Caixeta, Câmaras Cíveis / 4ª CÂMARA CÍVEL, Julgamento: 16/01/2014, Publicação: 22/01/2014.)
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Jurisprudência STF - Adoção por casais homossexuais


O Supremo Tribunal Federal ao negar seguimento ao Recurso Extraordinário 846102, reconheceu o direito de casais homossexuais adotarem nas mesmas circunstâncias que casais heterossexuais.

Na decisão a relatora frisou que "a Constituição Federal não faz a menor diferenciação entre a família formalmente constituída e aquela existente ao rés dos fatos. Como também não distingue entre a família que se forma por sujeitos heteroafetivos e a que se constitui por pessoas de inclinação homoafetiva" Carmen Lúcia

SEGUE A ÍNTEGRA DA DECISÃO DO RE/846102
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DECISÃO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA E RESPECTIVAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS.  ADOÇÃO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 4.277. ACÓRDÃO RECORRIDO HARMÔNICO COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.

Relatório

1. Recurso extraordinário interposto com base na al. a do inc. III do art. 102 da Constituição da República contra o seguinte julgado do Tribunal de Justiça do Paraná:

“APELAÇÃO CÍVEL. ADOÇÃO POR CASAL HOMOAFETIVO. SENTENÇA TERMINATIVA. QUESTÃO DE MÉRITO E NÃO DE CONDIÇÃO DA AÇÃO. HABILITAÇÃO DEFERIDA. LIMITAÇÃO QUANTO AO SEXO E À IDADE DOS ADOTANDOS EM RAZÃO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DOS ADOTANTES. INADMISSÍVEL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. APELO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Se as uniões homoafetivas já são reconhecidas como entidade familiar, com origem em um vínculo afetivo, a merecer tutela legal, não há razão para limitar a adoção, criando obstáculos onde a lei não prevê.
2. Delimitar o sexo e a idade da criança a ser adotada por casal homoafetivo é transformar a sublime relação de filiação, sem vínculos biológicos, em ato de caridade provido de obrigações sociais e totalmente desprovido de amor e comprometimento” (doc. 6).

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.

2. O Recorrente alega contrariado o art. 226, § 3º,  da Constituição da República, afirmando haver
“duas questões jurídicas que emergem do contexto apresentado, para que se possa oferecer solução ao presente recurso: i) se há possibilidade de interpretação extensiva do preceito constitucional para incluir as uniões entre pessoas do mesmo sexo na concepção de união estável como entidade familiar; ii) se a interpretação restritiva do preceito constitucional incorreria em discriminação quanto à opção sexual.
(…)
Logicamente, nem dois homens e uma mulher; nem duas mulheres e um homem (fatos estes que não chegam a ser tão raros em certas regiões do Brasil); nem dois homens ou duas mulheres; foram previstos pelo constituinte como configuradores de uma união estável, ainda que os integrantes dessas relações, hipoteticamente consideradas, coabitem em caráter análogo ao de uma união estável, ou seja, de forma pública e duradoura, e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
(…)
Com isso, a nível constitucional, pelo que foi dito, infere-se, em primeiro lugar, que não há lacuna, mas sim, uma intencional omissão do constituinte em não eleger (o que perdura até a atualidade) a união de pessoas do mesmo sexo como caracterizadores de entidade familiar.
(…)
E vamos além, a generalização, no lugar da individualização do tratamento jurídico a ser dado a situações materialmente diversas, poderá, sim, se não respeitadas e previstas as idiossincrasias e particularidades dos relacionamentos homoafetivos, vir em maior prejuízo que benefício aos seus integrantes, ferindo axialmente o princípio da igualdade, por tratar igualmente situações desiguais” (doc. 7).

Apreciada a matéria trazida na espécie, DECIDO.

3. Razão jurídica não assiste ao Recorrente.

4. No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 132, Relator o Ministro Ayres Britto, por votação unânime, este Supremo Tribunal Federal deu interpretação conforme ao art. 1.723 do Código Civil, “para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, entendida esta como sinônimo perfeito de família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva” (DJe 14.10.2011).

No voto, o Ministro Relator ressaltou que
“a Constituição Federal não faz a menor diferenciação entre a família formalmente constituída e aquela existente ao rés dos fatos. Como também não distingue entre a família que se forma por sujeitos heteroafetivos e a que se constitui por pessoas de inclinação homoafetiva. Por isso que, sem nenhuma ginástica mental ou alquimia interpretativa, dá para compreender que a nossa Magna Carta não emprestou ao substantivo “família” nenhum significado ortodoxo ou da própria técnica jurídica. Recolheu-o com o sentido coloquial praticamente aberto que sempre portou como realidade do mundo do ser. Assim como dá para inferir que, quanto maior o número dos espaços doméstica e autonomamente estruturados, maior a possibilidade de efetiva colaboração entre esses núcleos familiares, o Estado e a sociedade, na perspectiva do cumprimento de conjugados deveres que são funções essenciais à plenificação da cidadania, da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho. Isso numa projeção exógena ou extramuros domésticos, porque, endogenamente ou interna corporis, os beneficiários imediatos dessa multiplicação de unidades familiares são os seus originários formadores, parentes e agregados. Incluído nestas duas últimas categorias dos parentes e agregados o contingente das crianças, dos adolescentes e dos idosos. Também eles, crianças, adolescentes e idosos, tanto mais protegidos quanto partícipes dessa vida em comunhão que é, por natureza, a família. Sabido que lugar de crianças e adolescentes não é propriamente o orfanato, menos ainda a rua, a sarjeta, ou os guetos da prostituição infantil e do consumo de entorpecentes e drogas afins. Tanto quanto o espaço de vida ideal para os idosos não são os albergues ou asilos públicos, muito menos o relento ou os bancos de jardim em que levas e levas de seres humanos abandonados despejam suas últimas sobras de gente. Mas o comunitário ambiente da própria família. Tudo conforme os expressos dizeres dos artigos 227 e 229 da Constituição, este último alusivo às pessoas idosas, e, aquele, pertinente às crianças e aos adolescentes.
Assim interpretando por forma não-reducionista o conceito de família, penso que este STF fará o que lhe compete: manter a Constituição na posse do seu fundamental atributo da coerência, pois o conceito contrário implicaria forçar o nosso Magno Texto a incorrer, ele mesmo, em discurso indisfarçavelmente preconceituoso ou homofóbico. Quando o certo − data vênia de opinião divergente - é extrair do sistema de comandos da Constituição os encadeados juízos que precedentemente verbalizamos, agora arrematados com a proposição de que a isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Entendida esta, no âmbito das duas tipologias de sujeitos jurídicos, como um núcleo doméstico independente de qualquer outro e constituído, em regra, com as mesmas notas factuais da visibilidade, continuidade e durabilidade”.

O acórdão recorrido harmoniza-se com esse entendimento jurisprudencial.

Nada há, pois, a prover quanto às alegações do Recorrente.

5. Pelo exposto, nego seguimento a este recurso extraordinário (art. 557, caput, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal).

Publique-se.

Brasília, 5 de março de 2015.

Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora



REFERÊNCIAS:

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 846102.
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